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Magda Pucci

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): https://apoia.se/abelezadosom abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro

Helena Piccazio

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): https://apoia.se/abelezadosom abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Introdução Musical https://www.youtube.com/watch?v=gKTZPNa8C4E É muito reconfortante ter alguém para conversar sobre esses dilemas musicais, sobre as pedras no caminho, sobre as crises existenciais de músico, sobre nossos sonhos e frustrações. [...] Será só eu, ou conversamos muito pouco sobre as sombras da profissão? - Helena Picazzio Os problemas que envolvem a carreira do músico no séc. XXI vão além da formação musical. Ser músico, mais precisamente violinista, no século em que as atividades orquestrais estão em aparente declínio, constituí um paradoxo aqueles que almejam o sucesso da atividade artística como profissão. Como disse a violinista Elizabeth Chang em entrevista para Helena Piccazio no blog Papo de violinista “é muita gente para pouco emprego”. Cabe observar que a velocidade das mudanças nesse século não traz só crises existenciais e frustrações. Há um universo de oportunidades que se apresenta no horizonte. Nunca na história as informações foram compartilhadas com tamanha velocidade. Se há uma solução nova para trechos do concerto de Tchaikovsky descoberta no oriente, logo ela estará a um clique de distância dos demais intérpretes no ocidente. Portanto, sobra aos estetas sonoros a reinvenção. Não só o ato de procurar seu lugar ao sol, todavia a construção do mesmo. Alguns – como esse que agora vos fala –, intercalam as atividades didáticas com pretensas atividades jornalísticas. Trazendo aos ouvintes, essa espécie em vias de extinção – conversas, insights e comentários sobre o fenômeno sonoro. Outros e outras, como a entrevistada de hoje, compartilham sua trajetória, anseios, êxitos e angústias na hercúlea tarefa da performance, divulgando as descobertas de sua curiosidade insaciável através de blogs e redes sociais. O papo hoje, mais precisamente o papo entre violinistas, será com Helena Picazzio. Paulistana, formada em música pela FAAM é violinista da Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo e professora na EMESP (Escola de Música do Estado de São Paulo). Desde 2013 é autora do blog “Papo de violinista”, onde traduz materiais e traz entrevistas com nomes relevantes do meio musical clássico como John Thoner, Vadim Repin e Rachel Barton Pine. Helena conversa hoje conosco falando do seu projeto Tchaikovsky, da sua trajetória, do seu blog e de algumas ideias do livro O Ponto de Mutação de Fritjof Capra: Como a ruína do mundo fundado nos princípios Cartesianos e Newtonianos afeta a carreira artística? Quais são as sombras da profissão do músico? Por que conversamos tão pouco sobre as crises existências dos intérpretes? Essas e outras observações perspicazes na beleza do som da voz de Helena Picazzio

Anna Maria Kieffer

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): https://apoia.se/abelezadosom abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Introdução Musical https://www.youtube.com/watch?v=QFg6ljzC1r4 Ao contrário da forma como é constantemente pensada e utilizada, a música não é apenas uma forma de entretenimento, mas sim parte construtora das culturas, veiculando e refletindo seus valores, sua visão de mundo e sua história. Daí seu valor incalculável como forma de conhecer o mundo e de estar nele. Conhecer as raízes de sua própria música é reencontrar-se diante de uma identidade nem sempre conhecida e mesmo suspeitada" – Anna Maria Kieffer Querido ouvinte leitor, espécie estimada em vias de extinção, hoje esse programa nos convida para uma viagem no tempo através dos sons e da experiência da nossa convidada. A música como produto cultural de seu tempo carrega consigo uma identidade cronológica. Fazer e pesquisar sobre música seriamente, seja na seara popular ou clássica, é estar às voltas com os sons que nos são legados. Em um exercício historiográfico para entender a identidade das nossas concepções sonoras é necessário estudar com meticulosidade os processos culturais e sociais que culminaram na formação dos nossos sons no passado. Há correntes na música clássica cujo preciosismo histórico pede por interpretações historicamente orientadas. Interpretações que logrem alcançar condições semelhantes à contemporaneidade da obra, e não do intérprete. E esse é mais um dos trabalhos da musicologia, o estudo da música e dos sons em sua mais ampla diversidade social, regional, étnica e cultural. Para nós contemporâneos esse programa está sempre em busca de respostas para encontrar a beleza do som. E partindo em rumo ao inexplorado da apreciação resta saber, acompanhar e averiguar para aqueles que habitavam esse lugar antes de nós e são responsáveis pela nossa formação, onde estava a Beleza do som? Cantora, pesquisadora, criadora, produtora: o trabalho artístico de Anna Maria Kieffer inclui tudo isso, mas ainda não se esgota nesses termos. Assim a jornalista Camila Frésca nos fala um pouco dos méritos da convidada. Sua carreira é prolixa em feitos e segue em constante reinvenção. Hoje para reconhecer a beleza do som passando pelos contemporâneos aos músicos do séc. XIX E XVIII indo até às raízes da nossa música, contaremos com a beleza do som da voz de Anna Maria Kieffer.

Camila Frésca

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): https://apoia.se/abelezadosom abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Introdução Musical https://www.youtube.com/watch?v=4FPTNiit0Uk Em “Don Giovanni”, de Mozart, elas são troféu e conquista para o protagonista; “Rigoletto”, de Verdi, última ópera apresentada no mesmo Theatro Municipal, começa com um estupro, que será seguido por outros no desenrolar da trama. Já a famosa “Carmen”, de Bizet, uma das poucas heroínas que não se dobra aos desejos masculinos, acaba vítima de feminicídio. – Camila Frésca no artigo Ópera sobre abuso sexual escrita por mulheres chega ao Theatro Municipal Há cem anos o Brasil passava uma transformação cultural. Entre os dias 13 e 19 de fevereiro de 1922 inaugurava-se o modernismo no Theatro Municipal de São Paulo. Desde lá nossa cultura passou por diversas transformações. Observando o que nos toca - o maravilhoso universo dos sons – compositores como Heitor Villa Lobos e perifericamente Flausino Vale davam as suas respectivas contribuições para a história da arte. Esses temas e outros que nos são caros fazem parte do cotidiano daqueles e daquelas que nesse ano lidam com o efêmero jornalístico e tem por profissão a difusão da cultura. Tendo passado um século da semana de 22, quais são as pautas mais urgentes no universo da arte e da música clássica brasileira? A participação das mulheres; o desvario da política nacional; as propostas decoloniais em arte ou os anos pandêmicos; enfim, sobre o que falar? O que deve ser noticiado e comentando? Essas e outras inquietações serão respondidas hoje pela nossa convidada. Ela é musicista, escritora e pesquisadora. Camila Frésca escreve na Folha de São Paulo e na revista Concerto. Esse ano está imbuída de nos entregar mais uma biografia do grande compositor Heitor Villa-Lobos. Camila é doutora e mestre em Artes/Musicologia pela escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. No seu currículo lattes lemos: É autora dos livros Festival de Inverno de Campos do Jordão 50 anos pela Editora da Osesp em 2019. Uma extraordinária revelação de arte?: Flausino Vale e o violino brasileiro e Música nas montanhas: 40 anos do Festival de Inverno de Campos do Jordão pela editora da Santa Marcelina Cultura. Em 2011 idealizou e dirigiu o CD “Flausino Vale e o violino brasileiro, com violinista e maestro Cláudio Cruz, o CD foi vencedor do Prêmio Bravo! 2011 na categoria música erudita. No mesmo ano revisou, ao lado de Cláudio Cruz, as partituras da primeira edição integral dos 26 prelúdios característicos e concertantes para violino do compositor Flausino Vale, publicada pela Editora Criadores do Brasil. Camila Fresca conversa hoje conosco falando sobre modernismo, semana de 22, Heitor Villa de Lobos, Flausino Vale, suas participações nos diversos periódicos de cultura e a participação das mulheres na música de concerto, e por último, mas não menos importante, desses diversos fatores culturais e sonoros, de onde podemos entrever a Beleza do Som.

Daisy Fragoso

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): https://apoia.se/abelezadosom abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Daisy Fragoso Querido ouvinte/leitor, espécie estimada em vias de extinção, sejam todos e todas bem-vindos e bem-vindas ao segundo ano da nossa busca incansável pela beleza do som. Neste ano, para quem acompanha a plataforma nas redes ao lado, verá que as nossas cores mudaram. Os tons escuros saem de cena e os tons claros sobem ao palco trazendo diversidade e mais beleza ao nosso design, e também ao nosso discurso. A mudança vai além da aparência, corrigindo equívocos, para que A Beleza do Som seja completa, iniciaremos o ano com convidadas mulheres. Sem perder a seriedade na busca, nossa plataforma de discussão compartilhada e comunitária sobre música e o maravilhoso universo dos sons segue criando e interagindo na busca de trazer beleza ao som, através da diversidade. Falando em diversidade a conversa de hoje contará com a beleza não só do som, mas também das ideias da nossa convidada. Uma das formas mais interessantes de conhecer outras culturas é através de seus hábitos sonoros. Quando seduzidos pelo que há de belo nos sons de culturas alheias fazemos automaticamente um exercício de respeito e empatia. Para que isso aconteça nós contamos com o trabalho de profissionais de música, mais precisamente aqueles que dedicam a sua atenção às questões da etnomusicologia. Vivemos os paradigmas das questões climáticas. Voltar os olhos para as culturas que dividem essa terra conosco sem machucá-la é questão de sobrevivência. Observar seus processos de aprendizagem, alimentação, dança, música, brincadeiras e cultura nos colocará no caminho de um modo de viver menos nocivo ao planeta. Para tanto, é necessário que disfrutemos da boa convivência com os povos originários. Não os índios, já que não são só um povo, mas os povos indígenas em sua imensa pluralidade e totalidade. Atualmente o Brasil conta com cerca de 160 línguas e dialetos indígenas. Os povos que habitavam essas terras antes da chegada dos portugueses somavam cerca de três milhões de habitantes, hoje contamos com apenas 818 mil indígenas. Perdemos não são só sons, todavia culturas inteiras, outras maneiras de viver e se relacionar com o meio. Empobrecemos na busca pela suposta riqueza. Daisy Fragoso é doutoranda pela USP (Universidade de São Paulo), com linha de estudo em etnomusicologia. Educadora musical desenvolve junto a aldeia Tenondé Porã em São Paulo trabalho de pesquisa, aprendendo sobre as músicas e brincadeiras dessa etnia indígena. Atualmente é professora substituta no curso de licenciatura em música da UNESP (Universidade do Estado de São Paulo) e hoje dividirá conosco um pouco da sua experiência, trazendo diversidade e riqueza à Beleza do Som.

Leandro Oliveira

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Leandro Oliveira “Em resumo: se o ouvinte acha que a música popular é reserva de anseios “baixos” ou vulgares, é importante deixar claro: está ouvindo a música popular errada. E se acha que toda música clássica eleva, talvez não esteja ouvindo bem...” – Falando de música, Oito lições sobre música clássica – Leandro Oliveira A música clássica, ou erudita, termo que o entrevistado de hoje desaconselha o uso, tem nuances que demandam do ouvinte e de performer certa pesquisa, empenho e cocriação, assemelhando-se a uma sociedade secreta por conta de seus vários códigos ritualísticos, analogia também feita pelo nosso convidado. Esse gênero musical carece comumente de uma espécie de oráculo para que possamos adentrar no templo da apreciação. Deixando todo o misticismo de lado, antes do adjetivo vem o sujeito, e no caso da música, em seus diversos idiomas, como linguagem é de uma complexidade sem fim, como arte renova-se constantemente encontrando formas de se fazer significativa e presente no nosso cotidiano. Seja qual for o gênero se você quer apreciar com propriedade o que ouve, e entender a Beleza do Som, uma tutoria fará bem. Para tanto, pede-se que esse tutor seja um expert em sua área, não só um mero executante, todavia alguém cujo perfil didático logre explicar com facilidade a ontologia do universo sonoro. Leandro Oliveira é pianista de formação, compositor, diretor de audiovisual, regente e escritor. Desenvolveu durante doze anos atividade didática na Sala São Paulo, tendo explicado ao público centenas de programas. Como diretor de audiovisual atuou com diversos grupos, sendo indicado esse ano ao prêmio da revista Concerto pelo trabalho junto à Orquestra Filarmônica de Minas Gerais em suas transmissões ao vivo. Nas suas palavras a função de um diretor de transmissão é “organizar as muitas variáveis entre as necessidades das telas e as necessidades dos artistas no palco - sob sua responsabilidade está a tradução do evento presencial para o público remoto. Por isso, ele precisa saber o mapa da orquestra e a partitura, eventualmente, mas precisa antes entender os limites para negociação das necessidades do evento presencial, além de deter conhecimentos suficientemente abrangentes para cooperar e coordenar equipes de funções hiper complexas - sejam as do palco, sejam as do estúdio de transmissão.” Um gênero musical que sempre dialoga com o passado e está em frequente embate para se manter vivo no contemporâneo, assim a música clássica renasce através da ótica de Leandro Oliveira; buscando as novas mídias a música clássica segue subsistindo, alçando a inserção em novos mercados e lutando pela atenção de públicos mais jovens. Leandro tem mestrado em Musicologia, pós-graduação em Teoria da Comunicação, e é Doutor em “Educação, Arte e História da Cultura” pela Universidade Mackenzie e hoje conversa conosco falando sobre a beleza do som.

Mere Oliveira

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Cláudia Feres

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Cláudia Feres A atividade musical raramente encontra um fim em si mesmo. Fazer música de maneira séria é frequente assistir-se às voltas com questões sociais urgentes. Participar da vida cultural da sua cidade através da expressão de suas habilidades musicais é uma tarefa que exige um processo constante de resiliência. Explicar para aqueles à nossa volta, que a necessidade do fazer musical, principalmente no caso da música sinfônica, é de enriquecimento à cultura local, exige não só habilidade técnica como uma sensibilidade artística sem fim. Fazer tudo isso em um meio dominado por homens acrescenta à problemática certa dificuldade, todavia a convidada de hoje vai além dessas questões. Cláudia Feres é paulistana, formada em composição e regência pela UNICAMP, tem mestrado pela Northwestern University em Chicago, sob a orientação do maestro Victor Yampolsky. Filha da grande educadora musical Josette Feres, a maestrina destaca-se atualmente como uma das grandes regentes brasileiras em plena atividade. Pela sua batuta já passaram os grupos: Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas, Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, Amazonas Filarmônica, Orquestra Jovem de Brasília, Orquestra Jovem de Campinas, Orquestra de Câmara da UNICAMP, Camerata Fukuda, Sinfonia Cultura, Orquestra de Câmara de Blumenau entre outras. A maestrina também participou do Movimento Mulheres Regentes, iniciativa que logra falar dos problemas encontrados pelas mulheres na regência orquestral e regeu a Orquestra Filarmônica de Mulheres, subsidiada pela Avon. Atualmente é diretora artística e regente da Orquestra Sinfônica de Jundiaí. Cláudia Feres conversa hoje conosco falando de sua trajetória e sobre a participação das mulheres regentes na construção da Beleza do Som.

Paulo Bosisio

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Leandro Tigrão

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Marcelo Vilarta

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro Marcelo Vilarta A ritualística da música sinfônica, é presa a formalismos simbólicos. Quando ouvimos ou assistimos música “clássica”, estamos sentados, na frente da uma orquestra com seus músicos em absoluta concentração. Lembro que em concertos didáticos a maestrina Cláudia Feres ao ensinar ao público a importância do silêncio dizia que quando dávamos uma folha com um dos lados já usado para uma criança desenhar, ela a virava, em busca da parte mais limpa para sua arte. Assim nasce a necessidade do silencio na apreciação da música de concerto. O que ali será feito é de tamanha sutileza, de modo que o menor ruido rabiscaria a folha branca, onde a orquestra espera desenhar sua música. Acompanhado desse silencio sepulcral há as palmas e a entrada dos músicos no palco, seguidos do spalla, afinação e depois o maestro. Na hora da afinação o spalla, logo após receber suas palmas, dá as costas à plateia e vira-se para um instrumento das madeiras; um instrumento de paleta dupla conhecido como oboé. Ouve-se então o famoso lá, na frequência exata de 442hz, a depender da precisão do oboísta. O spalla conduz a afinação por famílias: metais, madeiras e depois cordas, divididas em graves e agudas. O que se vê na verdade é um ritual. Com o aparato tecnológico contemporâneo, cada músico pode, e deve, afinar seu instrumento antes do concerto ou ensaio. Nessa hora o que vemos é somente a verificação da afinação. Se nos concertos há um silêncio absoluto que precede a entrada do maestro, e a afinação, nos ensaios – fora raras exceções – o que vemos é completamente diferente. O spalla se levanta na hora do ensaio e começa uma verdadeira batalha pela atenção dos músicos. Como no mundo erudito tudo segue um suposto refinamento cívico. O spalla espera que só o ato de ficar em pé fará os músicos ficarem em silêncio. Ledo engano. Entre os colegas inicia-se uma guerra interna de “xius”, olhares cortantes e caras e bocas acusatórias, pedindo aos mais sonoros que calem. Claro, querido ouvinte, você pode achar que as minhas palavras são inverdades. Te convido a fazer uma experiência, vá ao concerto de qualquer orquestra, da mais iniciante até a mais experiente, e depois vá ao ensaio. Tire as suas conclusões. Pedir aos músicos com instrumentos nas mãos silêncio, é – acredito –, e sempre será, a coisa mais antinatural do mundo. Deixando a balburdia orquestral de lado, hoje descobriremos a Beleza do Som do oboé. Um instrumento caro, cujo acesso nos últimos anos tem sido democratizado pelos seus entusiastas. Marcelo Vilarta iniciou seus estudos aos 12 anos na Banda Municipal do Quiririm em Taubaté, aos 16 encantou-se pela Beleza do Som do Oboé, foi aluno da Escola Municipal de Artes Maestro Fêgo Camargo, da EMESP (Escola Municipal de Música de São Paulo), e integrou como bolsista à Banda Sinfônica de Taubaté, à Orquestra Sinfônica Jovem de Taubaté e à Orquestra Experimental de Repertório. Hoje faz parte da Orquestra Sinfônica do Paraná e conversa conosco, falando sobre a Beleza do Som do Oboé.

Gabriel Squizzato

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Ajude-nos (pix): abelezadosom@outlook.com Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro A Beleza do Som presta sua homenagem ao grande pianista brasileiro Nelson Freire, que nos deixou no dia 01 de novembro, aos 77 anos. De carreira internacional, Freire é notadamente um esteta sonoro sem precedentes na história recente do Brasil. De sensibilidade ímpar, nos deixa com gravações preciosas, onde se é possível reconhecer sem dúvidas a beleza de seu som. A Nelson Freire, nossa singela homenagem. https://www.youtube.com/watch?v=sTodU4Hk3_I Estudar e fazer carreira na Europa é o horizonte dos sonhos dos jovens instrumentistas. Sempre instados ao perfeccionismo acrobata, fazem o possível e o impossível para viabilizar a trajetória; já que lá, acreditam, é onde poderão de fato obter o pleno desenvolver de suas faculdades artísticas. No exterior deparam-se com as instituições seculares da música de concerto funcionando há plenos pulmões, e, se tudo vai bem, logo, além do estudo, conseguem trabalho. Se as coisas não vão bem, deparam-se com horas de trabalhos (não artísticos) excruciantes, atreladas às exigências infindáveis de seus locais de ensino. Aos que tudo vai bem, se há algum resquício de compaixão, resta uma pergunta, o que será daqueles nas terras tropicais? Nestes dias as terras tropicais sofrem com as intempéries da crise política. Lá fora viramos chacota, ou exemplo do que não se fazer na pandemia. E essa é só uma das nossas crises. Antes da pandemia já vínhamos de uma crise financeira que a cada dia mais se intensifica. Alguns de nós foram de músicos à motoristas de aplicativo, não por opção, mas por necessidade. É impossível manter a beleza do nosso som se nos falta o básico. É impossível manter a beleza dos nossos sons se a cada dia nossos vínculos empregatícios ficam mais fragilizados. A nossa fome e sede de formação, e informação, dá lugar a uma fome real. As preocupações técnicas cedem lugar às preocupações estruturais. O que será do futuro da nossa profissão? Nesse universo de incertezas ver como os países cujas instituições seculares de música se mantém, apesar dos apesares, serve de estudo ao nosso caso. Longe de com isso sanar nossas mais severas carências sociais, com as soluções dos colonizadores, entretanto, ajuda a entender como manter viva a chama da música, de forma que as tempestades sociais e políticas não a apague. Assim nasce uma classe de jovens músicos com “Ouvidos Pensantes”, músicos que além da habilidade na performance, almejam ler conjecturas sociais tão bem quanto as partituras e esperam conseguir dialogar, com e sem instrumentos, com as necessidades do contemporâneo. Gabriel Squizzato é violista, radicado em Viena e assistente da renomada professora Jennifer Stumm, mantém junto as atividades musicais conversas francas com o meio, no intuito de pensar em soluções coletivas para os problemas que atingem a classe artística. É mais um desses que deixa o Brasil sem deixá-lo, mantendo-o no escopo de suas projeções. Gabriel começou seus estudos aos sete anos, no Brasil se formou em bacharelado em viola pelo Instituto de Artes da Unesp, sob orientação do professor Ricardo Kubala. Atualmente é coordenador do festival Ilumina, e diretor cultural no instituo Res Publica. Hoje conversa conosco falando um pouco mais das condições que permitem a beleza do nosso som.

Abner Brasil

Abner Brasil A metáfora do iceberg é comumente usada para explicar fenômenos cuja percepção visual desinteressada deixa transparecer somente uma parte pequena do todo. Todo músico é em si um iceberg. Toda performance, toda história, encarte e programa mostra uma pequena parte da trajetória do intérprete. Subimos ao palco e levamos ao público não mais que uma pequena demonstração daquilo que somos. E no final aplausos, críticas e para os mais curiosos, a pergunta: De onde vem a beleza daquele som? Formação. Eis a pedra fundamental por trás de cada artista. Pode ser a família, professor, projetos, igreja e afins. Para que tenhamos bons intérpretes é necessário a oportunidade de início em algum lugar. Oportunidade dada, resta-nos alguns questionamentos. Em quanto tempo se forma um músico? O que devemos ensinar? Se a família não tem condições, quem pagará por isso? E um universo de dúvidas recorrentes permeia o debate público sobre a problemática. Todavia, imaginemos que todas essas perguntas já tenham sido respondidas de forma exitosa, sobra outra: Poderá esse indivíduo transformar o mundo? Abner Brasil é violista, começou sua trajetória se vislumbrando pela Beleza do Som aos cinco anos, idade em que conhece o órgão e tem início o seu processo de aprendizagem. Lá pelos doze, cansado com as idas e vindas com a música, decidiu pegar com o afinco o tortuoso caminho da aventura musical e se comprometeu a não mais deixar de estudar. Promessa que mantém até hoje. No projeto Guri fez sua transição do violino para a viola. Na adolescência, os momentos em que trabalhou para custear aulas e instrumentos não faltam. Oportunidade atrás de oportunidade, desafio atrás desafio, sempre mais um degrau na escada rumo ao sucesso. Vende-se por aí a ideia de que talentos precisam ser forjados. Nada mais criminoso. Quando estudamos educação musical “forjar” é uma metáfora que passa por vezes longe do nosso vocabulário. Criar ambientes onde os sujeitos possam desfrutar do pleno desenvolvimento de suas potencialidades é um mote mais digno. Como diria Lênin “É preciso sonhar, mas com a condição de crer em nosso sonho”. Prover as condições necessárias para que os sujeitos possam crer nos seus sonhos é o x da questão. Romantizar o sofrimento, a exaustação física, emocional e psicológica para ilustrar de onde vem a Beleza do Som, é não só um equívoco, como também uma maldade escancarada nociva aos intérpretes. Faz crer que tudo depende do seu esforço, quando não, sem ajuda e condições propícias, dificilmente você irá longe. Para descobrir quão longe se vai com esforço, ajuda, condições às vezes propícias e às vezes não, no episódio de hoje a Beleza do Som recebe Abner Brasil. Violista, é egresso do projeto Guri, da Sinfônica da Heliópolis e da academia da OSESP, atualmente inicia o seu mestrado em Viena.

Nicola Krassik

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Rodrigues Nicolas Krassik O ano é 2001. Festival Chorando. Arcos da Lapa. Madrugada. Festa no Bar Semente, onde músicos do calibre de Hamilton de Holanda, passam para dar uma canja. No recinto, um pessoal já alegre. Nesse momento o Rio de Janeiro, ainda é lar da musicalidade e reúne as peças-chaves da confusão que dá origem à beleza dos nossos sons. Nessa fatídica madrugada, um jovem músico com seu violino de guerra, também já alegre, faz da noite carioca seu laboratório musical. No bar toca dois ou três choros que sabe, e aproveita para beber direto da fonte da sonoridade latina. Para integrar à festa, lá pelas três da manhã, chega Yamandu Custa com seu violão, e agora sim a noite está prestes a começar, o jovem violinista, impressionado com a canja que virou show de Yamandu, resolve se juntar com seu violino. Pronto. A cena do violino popular brasileiro nunca mais seria a mesma. O violinista amante dos ritmos brasileiros, é um francês que encontra nessas terras a alegria da brasilidade. Antes de vir para cá de mala e cuia, na França disseram que aqui ele só acompanharia cantores. Nada mais acertado, Nicola já acompanhou Gilberto Gil, João Bosco, Marisa Monte e Beth Carvalho, e esses são só alguns nomes da música vocal, na música instrumental poderíamos passar o episódio todo falando das suas contribuições que não terminaríamos há tempo. Quando Ricardo Herz, outro nome de peso no ramo, estava indo estudar na França, Nicolas Krassik estava iniciando sua carreira no Brasil. Oriundo de uma família de músicos, Nicolas iniciou os estudos no violino por volta dos cinco anos e meio. Aos dezenove terminou seus estudos de música tradicional no conservatório local. Querendo aprender improvisação para tocar rock, indicaram-lhe o jazz como uma porta de entrada. Uma dica peculiar que rendeu ao violinista o caminho das pedras para a sua identidade musical. Em uma noite na França convidado por alguns amigos para conhecer um bar que tocava ritmos brasileiros, encontrou ali a vocação de toda uma vida. Apaixonou-se pela beleza dos sons do Brasil. O filósofo Mangabeira Unger, brasileiro radicado no Estados Unidos, diz que apesar de falar com sotaque o português, ele não pensa com sotaque. O convidado de hoje tem o mérito de não só falar sem sotaque, como não pensar com sotaque. Ouvindo-o falar temos a impressão de conversar com um nativo. Não só o sotaque como as ideias de Nicolas, revelam um apreciador nato da cultura brasileira. Ouvi-lo tocar é encontrar um Brasil pulsante, alegre, esperançoso e apaixonado. Um Brasil diferente do que vemos hoje, onde a Beleza do Som é asfixiada por sucessivos cortes à cultura. Para entender um pouco mais do Brasil que apaixona e fascina estrangeiros, fazendo das terras tropicais sua morada, a Beleza do Som recebe Nicolas Krassik.

Renegado

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Rodrigues Renegado Até aqui a Beleza do Som se preocupou em te apresentar a música instrumental. Conhecendo a trajetória de alguns intérpretes; aos poucos nossa conversa pelo vasto mundo da música vai ganhando forma, e sobretudo, conteúdo. Falar de música sem predicados é difícil. Exige do interlocutor um ouvido, como diria Murray Schafer, pensante e sempre aberto. O conteúdo da música instrumental é por vezes hermético. A análise desse discurso harmônico é sofisticada e complexa, uma atividade que parece sair da arte para encontrar morada na física. Todavia, é hora de deixar a música instrumental de lado e conhecer a oralidade de gênero vocal. E aqui, a análise harmônica, instrumental e técnica dá lugar ao monopólio do texto. Uma musicalidade que é sobretudo oralidade. Um cantar, que enquanto fazer musical, é prática oral de luta, denúncia, revolta e liberdade. Esse é o rap, mas podia ser o samba, o reggae ou o funk, que como diz a letra: “É som de preto, de favelado, mas quando toca, ninguém fica parado”. Arte de natureza rítmica; é herança africana de riqueza exuberante. É retórica combativa, inflamável e instigante. É arte negra, e portanto, sua manifestação é por vezes marginalizada. Encontrar na música uma forma de se entender, e entender as engrenagens do mundo que o cerca, a fim de lidar com a própria rebeldia e se apropriar de discursos e causas de militância, é prática comum dos artistas forjados nessa arte. Agora a negritude tem voz, vez e ritmo. No Brasil somos 52% da nação. Somos maioria, não minoria como alguns querem convencer. Se ladram que as minorias precisam se curvar as maiorias, quando a hora da revolução chegar, é melhor que você tenha ciência de onde quer estar. Porque como diz o nosso convidado “na hora do perigo, quando a casa cai /Us guerreiro fica, us comédia sai” Hoje, acercando-nos de bons guerreiros a Beleza do Som tem o prazer de receber Flávio de Abreu Lourenço. Que de Abreu Lourenço não é, o nome que pode carregar contornos racistas cai, e rebatizado ele renasce Renegado. Filho de D. Regina, irmão de Marco Antônio e Daniele. Nascido e criado na Zona Leste de BH, mais especificamente na comunidade do Vera Cruz, onde milita desde os treze anos, tendo fundado a ONG “Arebeldia” e o grupo NUC (Negros da Unidade Consciente), Renegado fez de sua tribo o mundo, e do mundo sua nação. Saindo do Vera Cruz para se apresentar em shows em Nova York, Cuba, Europa e Oceania e América do Sul. Artivista premiado, e portador de uma oralidade musical em processo constante de sofisticação. Acaba de lançar há pouco o Single Black Power, com ninguém menos que a rainha da negritude Elza Soares, que é também sua madrinha musical. Renegado hoje conversa conosco, falando dos seus trabalhos musicais, de sua trajetória, parcerias, inquietações políticas e ativismo.

Fernando Deddos

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Rodrigues Fernando Deddos “A gente tem que estudar muito para tocar música de carnaval” – F. Deddos Cada instrumento musical tem sua linguagem e literatura específica. Portanto, como diria Mehmari, a música não é uma linguagem única, pelo contrário, é uma variação sem fim de dialetos que se chocam na busca de formar um todo organizado. Os instrumentos para motivos de catalogação são divididos por famílias; a grosso modo: metais, madeiras, percussão e cordas, que se dividem em friccionadas (aquelas com arco) ou dedilhadas (como o violão). Sobre as cordas friccionadas já nos alongamos bastante. Há uma lista de convidados de cordas para sua apreciação. Nesse episódio a nossa busca incansável pela Beleza do Som hoje chega aos metais. Vamos falar do Eufônio. Você, querido ouvinte, se não for do meio musical talvez não conheça esse instrumento. E, se você é músico, dependendo de qual microcosmo habita, há uma chance remota de que talvez esse nome não lhe seja peculiar. O que é o eufônio é uma pergunta cuja resposta deixo para as mãos, ou melhor, dedos hábeis do meu convidado. Me restrinjo a dizer que o Eufônio vem do termo grego euphonos, que significa som bonito. Nada mais justo, que um instrumento cuja definição é exatamente análoga ao da nossa plataforma, tenha voz na Beleza do Som. Esse instrumento exótico, na verdade, não tem nada de estranho. Raramente o veremos nas orquestras, contudo ele tem lugar reservado junto às bandas sinfônicas, bandas marciais e rodas de choro. O eufônio, que como o nome diz, soa bem, é um coringa nos grupos musicais, por vezes substituindo outros instrumentos, fazendo de maneira soberba acompanhamento e se destacando, quando necessário, em solos. Podemos ouvi-lo em adaptações de árias de Puccini como Nessum Dorma, ou embalando o baixo de alguma marchinha de carnaval. Circulando tão bem por universos que a priori parecem antagônicos, mas que de contrários não tem nada. Os eufonistas podem cair muitas vezes no precipício da erudição, ficando alijados para espaços sinfônicos, onde sua participação é por vezes diminuta. Abranger a formação sem perder as oportunidades do universo popular é um dos motes do nosso convidado. Sobre ele e seu CD, Eufônio Brasileiro, o portal Viva Música diz: “Deddos é um desses artistas poderosos cuja paixão por seu instrumento é capaz de nos iluminar com uma música inesperada e bela.. o disco é uma revelação comovente.. precisa ser aceito e mantido por perto, ao alcance da mão, do cotidiano.” Fernando Deddos, começa sua trajetória aos quatro anos de idade, passando pelo piano, e aos onze chega aos instrumentos de metais, consagrando-se hoje como um dos grandes nomes do Eufônio no mundo. O músico além de compositor, é Doutor em artes musicais pela University of Georgia, mestre em performance pela Duquesne University e graduado em Composição e Regência pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Unespar). Atualmente é presidente da ETB – Associação de Eufônios e Tubas do Brasil e professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Hoje, conversa conosco falando um pouco mais sobre a Beleza das suas ideias e do Som do Eufônio.

João Luiz Sampaio

João Luiz Sampaio [citação] “No Brasil de hoje, o presidente ignora as mortes, tantas delas provocadas por sua inação, e seus ministros relativizam a dor da morte. No Brasil de hoje, o governo questiona a importância de vacinas que podem salvar vidas. No Brasil de hoje, agentes governamentais falam abertamente em banir livros. Banir livros. No Brasil de hoje, mata-se aos poucos a atividade cultural por puro preconceito, ignorância e maldade. No Brasil de hoje, a democracia está em risco.” – Pelo que seremos lembrados? - João Luiz Sampaio Uma das crises frequentes da música clássica diz respeito ao seu arcaísmo. No meio, é comum que, ao venerar música antiga, o fazemos de forma antiga e portando debilitada. Lembro de um professor de violino que, quando instado a resolver problemas tecnológicos que fugiam do seu repertório, respondia dizendo que ainda vivia no barroco. Gabar-se sobre viver na época de Bach e Vivaldi, é uma problemática que vai além dos muros da estética. Algumas ideias barrocas não podem mais encontrar fôlego na nossa época. No contemporâneo a diversidade étnica luta para fazer A Beleza do Som de sua voz ser ouvida, contra a hegemonia do pensamento colonial. Em um meio onde o fazer é dominado pelo cenário eurocêntrico, pensar sem viralatismo é sair da caverna da suposta erudição. Entre os intérpretes, os artesões da arte musical, poucas vezes encontramos pensamentos que fujam de pressuposto colonial. O escopo dos sonhos dos jovens músicos eruditos, raramente veem fora das filas orquestrais espaço para suas realizações. E, um espaço onde não só a música barroca ecoa, contudo, as ideias, ver-se ocupado por imagens que não refletem a cultura dominante de poder, gera conflitos constantes de significado. Sobra aos críticos, jornalistas e formadores de opiniões, aqueles que assistem além do espetáculo musical, a função de abrir os olhos do público e dos executantes no que toca aos paradigmas da vida musical. Trazer à baila conceitos como racismo, misoginia e homofobia em um ambiente patriarcal que se vende como sofisticado, é luta constante desses que não só veem suas virtudes, mas também suas falhas. Hoje, a Beleza do Som recebe o jornalista e crítico musical João Luiz Sampaio. O crítico, é editor executivo da revista Concerto e jornalista de música clássica do Jornal O Estado de São Paulo, autor de “Ópera à Brasileira”; fala conosco a respeito do microcosmo da música erudita, ajudando-nos na nossa busca constante pela Beleza do som.

Irineu Franco Perpétuo

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. Rodrigues Irineu F. Perpetuo Nabokov diz que na sua família há dois tipos de pessoas, quem gosta e quem não gosta de Tchekhov, e geralmente quem não gosta, boa gente não é. No microcosmo da música clássica brasileira, há dois tipos pessoas, quem conhece e quem não conhece Irineu Franco Perpetuo, e geralmente quem não conhece, como diria João Gilberto, bom sujeito não é. A mise-en-scène da música clássica é presa a simbolismos ritualísticos que funcionam como uma barreira invisível, no intuito de afugentar o apreciador. Uma dessas barreiras é expressa através da sua cronologia. Como diz o provérbio bíblico: há um tempo determinado para todas as coisas. E no caso da música erudita, há, rigorosamente, um tempo para aplaudir, tossir, entrar e sair e do palco, e, no que toca aos pormenores na vida além palco; há o tempo de noticiar o concerto, o do concerto, e o tempo da crítica do concerto. Nesse ínterim surge a figura do jornalista musical. Responsável por traduzir a efervescência de acontecimentos musicais, não só ao público leigo, contudo também aos próprios músicos. Esses virtuoses das letras, tem a caneta e a língua sempre afinadas. Trocam as horas do labor instrumental pelo ofício da leitura e da escrita. No caso do convidado de hoje é autor de “Uma História Concisa da Música Clássica Brasileira” e “Como Ler os Russos”, isso para ficar em títulos mais recentes. O crítico já integrou as fileiras do jornal “Folha de São Paulo”, “Estadão”, e é voz comum dos concertos, e da revista Concerto. Sempre explicando o universo da música clássica, com curiosidades pessoais dos compositores preciosíssimas. Na voz de Irineu, gênios como Beethoven, Dostoiévski e Brahms, ganha contornos humanos. Ouvi-lo é ter a experiência da democratização do acesso à música sinfônica, partilhada de forma oral e sem formalismos pedantes. Nos seus cursos é como se o BBB, não Bach- Beethoven-Brahms, mas o programa televisivo, fosse ocupado pelas personagens da música erudita e da literatura russa. O jovem que aos catorze anos se interessa por títulos como Irmãos Karamazov além de crítico e jornalista musical, é também tradutor do russo. Por suas letras lemos os títulos PEQUENAS TRAGÉDIAS e BORIS GODUNOV, de Aleksandr Púchkin; MEMÓRIDAS DE UM CAÇADOR, de Ivan Turguêniev; A MORTE DE IVAN ILITCH, de Liev Tolstói; MEMÓRIAS DO SUBSOLO, de Fiódor Dostoiévski; VIDA E DESTINO e A ESTRADA, de Vassíli Grossman. Hoje, para falar um pouco, sem amarras instrumentais e sonoras, e podendo explorar com propriedade todo o universo semântico, retórico e filosófico da Beleza do Som, recebemos Irineu Franco Perpétuo.

Ricardo Herz

Para mais conteúdo: https://linktr.ee/abelezadosom Edição e entrevista: Ivanildo Jesus Design: Kas Hoshi e Victor R. RodriguesRicardo Herz Quando falamos de violino é comum que pensemos na imagem do violinista clássico/erudito. Essa terminologia esconde por base alguns conceitos e pré-conceitos. Na história da música chamamos de clássico o período que se estende do Séc. XVIII ao XIX. No caso da música europeia, marcado por compositores como Haydn, Mozart e Beethoven, também conhecidos como a primeira escola de Viena. Isso tudo para te dizer que, chamar um violinista de clássico, quer dizer que sua formação descende dessa tradição musical europeia. Vislumbrar a musicalidade além do eurocentrismo é tarefa que exige do ouvinte certo grau de desprendimento. Então o correto seria chamá-lo de músico erudito? Outro termo prenhe de problematizações, a erudição diz respeito tão somente à inclinação sem reservas do estudioso ao seu objeto de estudo. Localizar alguns violinistas como eruditos, em detrimentos de outros, é dar margem à vã interpretação. Há tipos diferentes de inteligência, e sobretudo, tipos diferentes de áreas de estudo e, portanto, escopos distintos de erudição. Nem só de música eurocêntrica vive o homem, mas também, dizem alguns, de xote, xaxado, baião e arrasta-pé. Darcy Ribeiro cunha o termo Brasis para falar da multiplicidade de culturas que se chocam e entrechocam, na tentativa de formar o que nós chamamos de nação. Esses choques e entrechoques produzem cultura musical diversa e ampla. E claro, um instrumento maravilhoso e intrometido como o violino, não poderia ficar de fora dessa dança. Um violinismo erudito que dedica o esforço de seus estudos a adentrar o maravilhoso universo dos ritmos brasileiros, encontra sua base nas mãos hábeis do músico Ricardo Herz. Ricardo começou suas aulas de música aos dois anos, aos seis foi mordido pelo violino. Estudou com nomes como a grande professora Elisa Fukuda, integrou a Orquestra Experimental de Repertório e fez o bacharelado de violino na USP, tudo isso sua formação clássica e erudita. O músico que tinha tudo para ser um instrumentista sinfônico - preso à fila de alguma orquestra – resolve se desprender para empreender em outros caminhos; do clássico ao jazz e do jazz ao forró. Aluno de Didier Lockwood e egresso da Berkley School – Ricardo tem se consagrado como referência em uma área pouco explorada; a área do violinismo brasileiro. Para sobreviver em um país de viralatismo, Herz é também produtor, compositor, arranjador, sonoplasta e professor e hoje conversará conosco falando um pouco sobre a beleza do seu som. Nos acompanha nessa conversa, a Dra. Ana Cristina Abrantes, diretora na Sphinx Organization.

Adyr Francisco

“Se nós não somos iguais, porque faríamos música igual?” – Adyr Franciso Os projetos sociais abrem as portas da musicalidade àqueles que de outro modo não teriam essa condição. O simples ato de colocar um instrumento na mão de uma criança, de maneira gratuita, pode resultar em um universo incontável de possibilidades. Imagine um jovem que morava em um bairro de trabalhadores em Volta Redonda, se radicar como violista em Bordeaux, na França? Com investimentos sistemáticos em educação, façanhas como essa e outras ainda maiores são possíveis. No 15º episódio desse podcast, recebemos o violista Iberê Carvalho. Falamos da viola, sobre sons, notas e identidade. Vimos que a viola exerce na orquestra e na música de câmara um papel diplomático; possibilitando que outros possam ter o brilho de sua voz intensificado. O processo de democratização do acesso à música de concerto é obviamente benéfico, todavia conta também com aspectos criticáveis. Ao colocar instrumentos de cordas friccionadas nas mãos das crianças levamos aos ouvidos e ao coração dos pequenos, toda uma concepção de mundo alheio ao seu ambiente doméstico. Os instrumentos de cordas friccionadas encontram seu apogeu no Europa, onde sua tradição remonta há cerca de quatro séculos. Ao ensinar música antiga, às vezes ensinamos de forma antiga e equivocada. Na tentativa de educar colonizamos gostos. Crítica feita, vamos aos benefícios. Propiciar esse acesso e garantir que jovens propaguem sua voz através desses instrumentos, é um exercício contínuo de democratização. Alguns desses jovens descobrem nas aulas de música a paixão de toda uma vida. Estudam, estudam e estudam. Não se satisfazem com a primeira orquestra, com a segunda e nem com a terceira... Com uma sede insaciável de formação e informação, eles se atiram sem temer às possibilidades. Nesse processo levam a musicalidade brasileira para além do país de extensão continental. Saem do Brasil, sem deixá-lo. Chegando inclusive a fazer recitais inteiros no exterior só com músicas de sua terra natal. Atribuem a Tom Jobim a frase “Viver no exterior é bom, mas é uma merda. Viver no Brasil é uma merda, mas é bom.” Para entender como se vive no exterior propagando a beleza da sonoridade brasileira, hoje conversaremos com Adyr Francisco. Como muitos, iniciou sua trajetória no violino e depois, tendo ouvido que a viola era mais fácil, resolveu mudar de um instrumento. Na viola encontrou sua voz. Oriundo de um projeto social no interior do Rio de Janeiro, Adyr, pelas palavras de seu professor Gabriel Marin é notadamente “um dos grandes talentos brasileiros da próxima geração de violistas.”

André Mehmari

Definir, estabelecer, delimitar, introduzir e apresentar. Um desafio constante. Definir é dar fim, mesmo que momentaneamente. Como dar fim à fenômenos artísticos efêmeros? Como explicar aquilo que se coloca como energia criativa em constante ebulição? Como apresentar e introduzir o gênio no esplendor de seus dias? Vou tentar algumas vezes caro ouvinte, e em todas garanto que você sairá maravilhado. No segundo episódio deste podcast falamos que “Antes de ser o homem é som”; que ainda na barriga da mãe, a batida do nosso coração condensa-se ao ostinato da nossa progenitora. E o nome disso, caros, é música. O nosso convidado veio ao mundo na banqueta do piano. Ainda cedo, tem fotos colocando “banca” no teclado. Sua mãe - uma amante das teclas cuja versatilidade ia de Nazareth a Chopin – foi responsável pelos seus primeiros passos no mundo da música. Antes de ser, o nosso convidado já foi musicalizado. Nesse universo em que a Beleza do Som não tinha começo e nem fim nasce André Mehmari. Nasceu em Niterói no ano de 1977. O nome Mehmari, descende do avô Sírio, que veio para São Paulo no começo do séc. XX trabalhar como alfaiate. Aos 11, o menino se muda para o interior Paulista. Nessa idade já tocava nos bailes acompanhando a mãe. Reza a lenda que mais improvisando do que se atendo ao tema. Descreve-se como: “Um menino solitário, com seu órgão eletrônico, tocando pelos bailes de Ribeirão Preto.” A paixão pelos bailes cede lugar ao Jazz. O jovem passa a nutrir sua insaciável sede sonora por outro estilo. Julgam que ele é um estudante de piano russo, que depois conheceu os ritmos brasileiros. Ledo engano, isso não é nada além de folclore. André conheceu tudo junto e misturado. Tudo ao inverso do reverso, no avesso, do avesso, do avesso. Tudo sem rótulos. Sem saber o que era erudito e o que era popular. Na sua casa só havia dois tipos de música, a música boa e a música ruim. Por volta dessa época conheceu Stravinsky. Através da sagração da primavera. Numa era pré-internet, com um xerox com dias contados. Perplexo com a obra do gênio russo se converteu de imediato ao culto “Stravinskyano”. Todavia, isso ainda não o explica. Isso ainda não o define. Dos bailes, ao jazz, ao bacharelado em piano na USP. Tudo com imensa naturalidade. Solista, camerista, e sobretudo compositor. Discografia vasta. Como diz Irineu Franco Perpetuo: “Miraculosamente prolífico, André Mehmari tem praticamente um disco gravado para cada ano de vida. Sobre o grande Ernesto Nazareth, Mehmari diz: “Um homem do seu tempo, como poucos. A fagulha do gênio brasileiro.” Palavras que certamente podem ser usadas para descrever o próprio André. Ser brasileiro nestes últimos dias é dar prova constante da nossa resiliência. Se há uma arquitetura da destruição em curso, há, por outro lado, agentes responsáveis pela arquitetura da construção. Ainda que eu descrevesse toda a biografia de Mehmari, seria impossível defini-lo. Sua música fala por si melhor do que qualquer texto e além do pretenso esforço das minhas palavras. Sem mais delongas, a Beleza do Som tem o imenso prazer de receber André Mehmari.

Cláudio Micheletti

Conta a história que após uma incrível apresentação do concerto de Tchaikovsky para violino e Orquestra, o solista Jascha Heifetz é interpelado por uma jovem na plateia, que perplexa com o virtuosismo do músico, lhe diz que o som de seu violino é maravilhosamente lindo, ao que o Heifetz, conhecido por seu porte austero e reservado, responde, colocando o instrumento perto do ouvido e dizendo a moça que não tinha ouvido nada. Dono de timbres diversos, som apaixonante, quente e aveludado, o violino, ao lado piano e do violão, reina soberano entre os instrumentos musicais. Presente do casamento às festas de finais de ano; e às vezes, até nos funerais, o instrumento se tornou um estandarte dos afetos exprimidos através dos sons. Símbolo máximo do universo sinfônico, sua literatura, técnica e possibilidades vêm se expandindo desde o século XVI, com a consolidação das mais diversas escolas técnicas violinísticas. Atualmente conta com uma gama incontável de variações de gêneros musicais, assim como intérpretes de exímia habilidade, por todo o globo. Cabe ao intérprete, àquele responsável por traduzir o fenômeno artístico em informação sonora cognoscível, a missão de decifrar todo o universo-técnico em expansão do violino. Uma jornada hercúlea, por um instrumento ingrato, cuja devota paixão do entusiasta o faz escravo permanente da estética, buscando sempre aprimorar sua técnica para atingir a beleza do som. Um desses intérpretes, cuja sede insaciável pela estética é marca registrada de sua trajetória, conversa hoje conosco. Cláudio Micheletti, nascido em Piracicaba, começou sua trajetória no violino aos 11 anos. Na adolescência, o instrumento disputava a atenção com o basquete, competição vencida, Cláudio fez do violino seu companheiro mais frequente. Com carreira radicada na cidade de São Paulo, tem especialização pela Academia Franz Liszt, sob orientação de Esztér Pereny, na Hungria. Hoje é Spalla da Orquestra Experimental de Repertório, Spalla da Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo, professor na faculdade Cantareira e conta com uma classe sempre cheia de alunos atentos Para descobrir de onde vêm a beleza do som do violino, falar de intérpretes e da trajetória profissional do violinista, hoje recebemos Cláudio Micheletti, em companhia de alguns alunos

Iberê Carvalho

Se você já teve a experiência de ir até um concerto, ver uma orquestra ou algo do gênero, perceberá que há certa hierarquia em como as coisas acontecem. Há toda uma ritualística simbólica na música sinfônica. Primeiro entram os músicos, conhecidos como “Tutti” - o termo em italiano que significa todos - com um ar aristocrático, e prenhes da mais pura elegância. Em sua maioria extremamente bem-vestidos. Diz-se, que até a roupa íntima, combina com as cores da gravata. Depois que esses todos, o tutti, entram, a figura imponente de um violinista com ar confiante e circunspecto surge da coxia. O spalla, àquela à esquerda do maestro, não em ideias, mas em região, recebe sozinho os aplausos, e conduz a afinação. Do silêncio da plateia o oboé, se bem executado, emite um sonoro e aveludado “Lá”, após a ordem do spalla, os músicos o copiam, afinam seus instrumentos, e se preparam para começar o concerto. Sentados ainda, tutti e spalla, ouvem ao longe o som de pisadas firmes e decididas. Outra figura, ainda mais imponente e aristocrática, se esgueira da coxia, àquele que ficará à direita do spalla e na frente de toda a orquestra, o mestre da cerimônia, não o MC, mas o Maestro. Sob uma salva de palmas solo, o maestro é recebido com os músicos ficando em pé, em sinal de absoluto respeito e comprometimento. Após essa demonstração viril de liderança, no pódio, o maestro, com um gesto despretensioso das mãos, sinaliza aos músicos que se sentem. Pronto, o concerto está prestes a começar. Todavia há alguns pormenores que exigem a nossa atenção. Atrás do spalla, à esquerda do maestro, estão os violinos, os primeiros violinos, soberanos das notas agudas. No lado oposto, na maioria das vezes, violinos maiores, como dizem as crianças, ou, os violoncelos, ainda com os músicos sentados e entre as pernas. Logo atrás destes a baixaria, os contrabaixos. Com os músicos sentados em banquetas maiores que os demais naipes da orquestra. Falta outro instrumento, para que o naipe das cordas esteja completo, temos os primeiros e segundos violinos, cellos e baixos, falta o ripieno, um instrumento maravilhoso e absurdamente diplomático. Seu registro contempla o grave, o agudo e o médio, faltam as violas. Cuidado! Não confunda com a viola caipira. A viola da orquestra é diferente, é uma viola de braço. Maior do que um violino, e tocada também com um arco, na orquestra encontra-se perpendicular ao maestro, entre os segundos violinos e os contrabaixos. Depois de toda essa ritualística explicada, há outros detalhes ainda mais prementes. No palco há hegemonias além dos violinos. Nas orquestras em geral, vemos uma série de instrumentistas brancos. Brancos, homens, heteros e cis. As explicações para esse fenômeno sociológico vão desde o racismo estrutural ao colonialismo vigente. Em um país de maioria negra, quanto mais refinado o ambiente orquestral, mais veremos pessoas brancas, infelizmente. Onde estão os negros? Será que eles não se interessam pela música orquestral? Preferem a agitação do baile funk, do rap ou do samba? Temo que não. Talvez o acesso, por uma série de impeditivos violentos simbólicos, lhes seja negado. Contudo, alguns, cuja maestria da trajetória desponta além do preconceito, tem êxito na luta pelo espaço de representatividade contra a hegemonia da branquitude sinfônica. Para falar de representatividade, negritude, racismo no ambiente musical de concerto e viola a Beleza do Som recebe o músico, aluno da Escola Superior de Artes em Frankfurt, na Alemanha, Iberê Carvalho.

Júlia Donley - Precarização do Trabalho Musical

A Precarização do Trabalho Musical Conta a história que enquanto as formigas se matavam de trabalhar para ter onde se abrigar no inverno a cigarra, musicista, passava as tardes na suposta prática laboral da sua arte. Enfim, quando o inverno finalmente chegou, a cigarra, cujo trabalho não lhe tinha proporcionado esteio, decidiu bater à porta das formigas em busca de abrigo, que lhe responderam da seguinte forma: — Muito bem, você não passou o inverno cantando? Pois agora dance! Na fábula, atribuída a Esopo por La Fontaine, a moral adverte-nos não só quanto à validade de se estar preparado para as adversidades, mas também quanto a uma visão de trabalho que não contempla o fazer artístico do esteta sonoro. Anos depois outro autor brasileiro, Monteiro Lobato, contou a história à sua maneira, dizendo que, quando a cigarra bate à porta da formiga para fugir dos malefícios do inverno, a formiga responde: “Pois entre, amiguinha! Nunca poderemos esquecer as boas horas que sua cantoria nos proporcionou. Aquele chiado nos distraía e aliviava o trabalho. Dizíamos sempre: que felicidade ter como vizinha tão gentil cantora! Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo o mau tempo.” Considerando o texto de Lobato, a reflexão mais imediata nos conduz a questionar o paradigma artístico-social ainda vigente: Será a arte, em suas mais diversas manifestações, um “trabalho”? E como tal, precisará de condições e salubridade que permitam sua execução, por conta de um fazer que além de sublimação estética, se coloca como prática laboral geradora de capital? Outro autor indispensável para a nossa análise acerca do fazer artístico é o músico, filósofo e teórico da comunicação T. W. Adorno. Discípulo de Berg e crítico arguto do capitalismo, emprega o termo Indústria Cultural para falar de bens de consumo intangíveis, onde o valor agregado não reside só no usufruto do cliente versus o custo da produção, mas passa à, como diz Jessé de Souza em “A Elite do Atraso”: [...] produzir homogeneização psíquica “por baixo”, de modo a poder garantir a maior vendagem possível de mercadorias simbólicas[...] Nesse panorama perverso da indústria cultural, o objetivo do fazer artístico-musical passa a ser dominado por uma elite, que, na melhor das hipóteses, quer a precarização do fazer artístico, vendo-o como supérfluo, dispensável e alienante. Em matéria recente da Folha de São Paulo, no dia 7 de agosto, de Paula Soprano e Bruno Santos, a manchete: “Metalúrgico, Músico, doméstica, atendente de Fast Food; brasileiros despejados vão morar na rua” denúncia o drama desses profissionais que não conseguem, durante a pandemia, fazer frente às várias despesas básicas do orçamento doméstico. A precarização do trabalho atinge a todos. Tema urgente no meio artístico-musical, com suas frequentes reestruturações, excetuando músicos cujo sucesso exponencial se iguale a Igor Stravinsky, John Williams e Beyoncé, todos os outros precisam diariamente lidar com as infindáveis crises do capitalismo e ver seu fazer ser alvo das famigeradas “políticas de austeridade fiscal”. Os desdobramentos sobre o tema vão desde a análise dos capitais simbólicos, do filósofo francês Pierre Bourdieu, à tiktokização e uberização do trabalho artístico. Será o fazer do esteta sonoro um “emprego”, e como tal merece todos os vínculos provenientes de uma legislação ampla sobre o tema, assim como seguridade social ou, a prática artística refinada; a musicalidade saudável e consciente; são meros passatempos didáticos de uma elite atrasada? Para debater esses e outros temas contaremos com o belo trabalho da flautista, formada pela Academia da OSESP, e Mestra em Sociologia pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais: Júlia Donley.

Anna Murakawa

“A música tem um potencial transformador. Pode mudar a vida de quem ouve, mas também – e principalmente – de quem faz dessa arte uma profissão.” Há pouco tempo atrás a Skatista Rayssa Leal trouxe ao Brasil a medalha de prata, pela categoria Street, nas Olímpiadas em Tóquio. Como se o feito, por si só, já não demonstrasse imenso virtuosismo esportivo, cabe ressaltar que, a Skatista, tem somente longevos treze anos. Nas mídias, além de notória e merecida comemoração, eclodiu a seguinte pergunta: “O que você estava fazendo aos treze anos?” Aos treze anos a convidada de hoje estava iniciando sua aventura pelo mundo dos sons. Semelhante à Rayssa Leal, ela também tem carreira internacional. Bacharelado na National Music Academy ‘Pancho Vladigerov’, na Bulgária; pósgraduação na Carnegie Mellon University, em Pittsburgh, Estados Unidos; mestrado na University of Louisville, em Kentucky e doutorado na University of Sydney, na Austrália. Porém, nem só cátedras e diplomas atestam, na atualidade, a validade da arte, a consolidação dos conhecimentos e a habilidade virtuosa. Esses títulos certamente compõem um substrato imenso; a raiz de uma árvore esplendorosa, todavia essa árvore conta também com belos - e necessariamente vistosos - frutos. Além de estudar, e de fato ser, é preciso, no mundo digital; na era das redes, aparecer. Os desafios que as redes sociais impõem aos intérpretes vão desde mera distração - no período de estudo - à necessidade contínua de exibição. Views e likes passam a compor, como diria Bourdieu, o nosso capital simbólico (digital). A validade do que fazemos é atestada pelo nosso interlocutor, e público, que agora, recebe um outro nome, o de usuário. Navegar no oceano digital, sem ser inadvertidamente um náufrago, exige do intérprete um outro virtuosismo, um virtuosismo socio-virtual. Digital influencer, international violinist e Doutora em Música, ela não naufraga nas redes, até a elaboração dessa “Ouverture” os números contam com: 75 mil incritos no Youtube, 502 mil seguidores no instagram e 40 mil seguidores no Facebook. Falar diariamente para esse número de pessoas, parece ser, a missão atual de um intérprete que, se vê na posição de tirar a música da ribalta, trazendo-a ao cotidiano do público. No caso da nossa convidada, a conversa também pode ser em sete línguas. Para falar de violino, música, educação e social media, hoje a Beleza do Som recebe Anna Murakawa. Como sonhos grandes dialogam, a conversa também contará com a participação da Dra. Ana Abrantes, diretora da Sphinx Organization, e a primeira convidada de cadeira cativa no Podcast.

Emmanuele Baldini

“Ser artista significa subir uma montanha já sabendo que nunca se chegará ao topo. Cada vez que nosso orgulho acha que chegamos ao topo, nos damos conta de que o topo não é nada mais que uma etapa intermediária e que uma nova subida precisa ser enfrentada.” Italiano, nascido em Trieste no ano de 1971, filho de professores de música do conservatório local. O convidado de hoje respira arte desde a mais tenra idade. Para ele não há quem o convença de que o violino não esteja vivo. Sua devoção pela música começa cedo, aluno do exigente Bruno Polli, do reservado Corrado Romano e da lenda do violino Rugiero Ricci, palavras dele, não minhas, tem seus pilares musicais extremamente bem fundamentados. Uma trajetória ornamentada por diversas belezas sonoras. Hoje recebemos Emmanuele Baldini. No meio erudito seu nome dispensa apresentações. Baldini, ocupa um dos lugares mais prestigiados do meio musical erudito, a cadeira de Spalla da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Mantendo a nossa função didática, sei que esses termos - para o ouvinte leigo - carecem de explicação, porém dessa vez contarei com o auxílio desse andarilho da música, que pode explicá-los de maneira mais pedagógica e acertada do que eu. A presença de Baldini nas redes sociais é massiva. Nas mídias expões sua contínua sede de estudo e tenta desmistificar os pormenores do backstage. O músico está no instagram sempre respondendo às perguntas dos entusiastas, está no facebook, no wordpress, no tiktok e no youtube. Talvez esses lugares de algum modo, dirão as pobres almas, danifiquem a imagem do artista clássico. Entretanto, também é possível encontrá-lo nas gravações no spotify por selos renomados, e em famosas salas de concerto pelo globo. Circular dessa maneira entre ambientes que a priori parecem antagônicos, é um exercício diário de fomento das artes, mais uma das formas que Baldini encontra para dialogar com alunos e público, além dos sons. Estando nas redes sociais ele não se esquiva das polêmicas. É honesto com o que pensa e aceita discutir com amabilidade. Para compartilhar conjecturas, críticas, análises, falar sobre filosofia, música e arte, e quem sabe talvez um pouco de violino; a Beleza do Som recebe hoje Emmanuele Baldini.

Ouvidos Atentos

A Beleza do Som não existiria sem a Beleza desse ouvido atento. E agora caro ouvinte, deixo as suas orelhas de lado, e direciono a minha voz ao meu amor. Meu bem, obrigado por me ouvir, mesmo quando a monotonia do som da minha voz arrasta-se por mais de vinte minutos por temas que ainda estou engatinhando. Obrigado por me ouvir tocar coisas pela primeira vez, simplesmente porque eu precisava de ouvidos que não fossem os meus. Namorar um músico, que vez ou outra escreve, e se mete a fazer podcast, é namorar um artista com demandas emocionais sem fim, e só quem lida, sabe a dificuldade empreitada. Através dos seus ouvidos eu ouço e conheço um mundo diferente. Através dos seus gostos sonoros descubro variedades que de outra maneira não conheceria. Você faz a minha vida melhor e mais interessante. Obrigado por aturar sempre, o não tão belo som da minha voz.

A Representação Social dos Sons

A arte esconde na manifestação a mensagem. Como um iceberg, à primeira vista só a superfície é visível, deixando a parte mais sólida e funda se chocar com o inconsciente da nossa compreensão. Cabe aos sujeitos em cultura, aqueles que dominam o papel da ação, explorar o oceano do subjetivo a fim de transmitir com clareza sua mensagem. Não é simplesmente manipular, é fascinar, seduzir e fazer ecoar a mensagem. No que tange à manipulação dos sons, há armadilhas para os intérpretes e para os apreciadores. Qual a mensagem que transfere um músico na sala de concerto, no palco de um estádio, no baile funk, no forró, na praça, no youtube, no pagode ou no carnaval? Não se trata da simples análise do processo artístico-estético da interpretação, mas sobretudo, qual imagem social que possibilita essa transmissão.

Musicalização: Um privilégio de classe?

Cada custo, cada dúvida, cada escolha e renúncia que levam o executante à busca pelo aprimoramento, são despesas às vezes não contabilizadas nas somas da do entusiasta, ou do ouvinte. Tocar bem, produzir um som bonito, é caro. Custará não só seu esforço, mas também um significativo valor sentimental e monetário. Volto à máxima liberal “ Não existe almoço de graça.” Qual o preço da beleza do som? Quanto custa a formação de um músico? Seja popular ou erudito. Quando há investimento público, de que forma esse valor retorna para a sociedade? Com todas essas dúvidas e custos, nos perguntaremos da validade dessa aventura. Quando se nasce em um meio com privilégios, fazer aulas de música, ter bons instrumentos, incentivo para o estudo, é uma simples “opção”. Quando não há privilégios, tornar-se músico é quase um ato de rebeldia, ou de demasiada coragem. Será o processo de musicalização, formação e aperfeiçoamento do esteta sonoro, um fetiche de classes elevadas? E a possibilidade de democratização de acesso, não mais que uma infâmia. Ou, é oferecer mesmo à quem não tem condições, o contato com arte. Possibilitando seu desenvolvimento, e a quem o cerca, a oportunidade de se sublimar com a beleza do som, deixando o mais rico, somando-o com sua diversidade.

A Afetividade na Educação Musical

Musicalizar sem tocar à afetividade é promover analfabetos funcionais musicais, ou no máximo, frustrar ao educando em um processo educacional nocivo. Afim de que a afetividade seja priorizada, o sistema de educação bancário precisa urgentemente cair em desuso. Só uma educação musical profícua pode salvar o ambiente musical orquestral, abrangendo suas possibilidades e cooptando novos ouvintes. Discussões como: " Será a música um termo colonizador?"; " Keith Swanwick NÃO é novo e NÃO é Método" e " Por que não há cargos públicos de música para grupos de pagode?", serão encontradas nesse episódio de " A Beleza do Som" em novo formato. Para discutir temas correlatos à educação musical, esse episódio conta com: a Prof.ª Ms. Talita Rodrigues pela UFRJ, o Prof. Ms. em Desenvolvimento Humano pela UNITAU Nelson Rechdan e o Profº Ms. em musicologia pela UNIRIO e Psicanalista Hudson Lima.

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