Renata Rodrigues e Giullia Assmann - Frequência Dissonante

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Edição e entrevista:

Ivanildo Jesus

Design:

Kas Hoshi e Victor R. Ribeiro 

Introdução Musical:

https://www.youtube.com/watch?v=d0a9k2dpBUQ 
 
Antes de entender que tinha um corpo de múltiplas possibilidades, eu entendi que esse corpo era assediado; antes de entender que eu queria uma carreira e ser boa no que me fazia feliz, me determinaram que eu nunca seria boa suficiente; antes de entender que eu tenho necessidades e carências, entendi que sentir "demais" era coisa de mulher, perdendo muito tempo com suas emoções, e por isso as fechei; antes de entender que queria ser livre, entendi que meu entorno faria de tudo para que eu não fosse; antes de entender que queria lutar para ser todo meu potencial, lutei para simplesmente poder existir. – Giulia Assmann  

 

            Segundo o compositor Arnold Schoenberg um dos aspectos importantes da história recente da música ocidental resume-se à emancipação da dissonância. O termo carregado de entendimentos e significados diversos no decorrer da história será usado hoje com seu remetente grego diaphonia, ou seja, sons separados, que não combinam. Já a consonância, com seu equivalente grego symphonia, sendo aquilo que soa junto, e portanto, combina.  

            Para iniciar a conversa pelo inexplorado da apreciação convido o ouvinte a passar pelo cantochão, ou canto gregoriano, e depois visitar a música de Schoenberg, a música de outrora, ocidental e europeia, feita para louvar ao sagrado cristão, encontrava-se às voltas com regras harmônicas imbricadas que resumiam os paradigmas da sociedade que a subsidiava. Veremos uma música vocal sem exuberância rítmica. O que não lhe tira o brilho, dado que os conceitos aqui trabalhados não são o de riqueza ou pobreza artística. Afinal cada fazer musical segue o recorte inequívoco de seu tempo, mas sim trabalharemos sob a égide da diversidade. Saindo da quase monotonia do século XIV para a efervescência musical do século XX, vemos uma música cujo intuito parece ser causar perplexidade. Uma música cuja finalidade não reside mais no louvor ao sagrado, ou a explicitar as paixões romanescas como no século XIX. A música dos modernos queria a libertação da dissonância contra a hegemonia da pseudo-agradabilidade da consonância. 

            E aqui, começamos e nos preparar para o clímax; ao ponto sensível da nossa apreciação. O que nos agrada como ouvintes? Além da simples definição dos nossos gostos dispersos em gêneros musicais; o que harmonicamente nos causa relaxamento, o que harmonicamente nos causa tensão? Do melômano ao leigo, nossa apreciação está sempre à mercê das intenções dos compositores. Não há som sem intenção, e não há intenção sem um conjunto de ideias, que, inconsciente ou conscientemente, norteiam a direção das conjecturas dos seus artesãos.  

            Deixando de lado a poética e a metáfora. O que expressa a hegemonia dos nossos sons? As vozes e sons que nos tomam de assalto, são vozes que contemplam a diversidade daquilo que somos, ou de um nicho específico? Enfim, quais são os ideais que constituem o conceito de beleza do nosso som? 

            O intérprete ou as intérpretes, aqueles e aquelas responsáveis por dar vida ao som, encontram-se muitas vezes cerceados de sua voz, por conta de uma hegemonia pouco dialogável. Se de um lado poeticamente a emancipação da dissonância se desenrolou no horizonte histórico, do outro a emancipação daqueles e daquelas cujas vozes foram sempre apagadas, segue em constante luta para a validação da sua existência. 

            As mulheres na música clássica é um tema urgente do contemporâneo. O patriarcalismo como traço cultural latente da nossa formação, encontra lugar na música, independente do gênero. No intuito de lutar contra a hegemonia da consonância patriarcal, trazendo dissonância ao debate através de uma frequência penetrante, nasce o coletivo frequência dissonante. Hoje converso com Giullia Asmmann, contrabaixista e mestranda pela UNESP e Renata Rodrigues, também contrabaixista e pós-graduanda da USP em gestão de projetos culturais, ambas são co-fundadoras do coletivo Frequência Dissonante.